DIÁRIOS DE CAMPANHA
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Ja temos todos os peixes necessários para as experiencias que planeámos, mas continuamos limitados pela falta de material. Ontem o Sarmiento de Gamboa, um dos dois navios espanhois que apoiam o Propolar tentou descarregar o nosso material depois de não ter sido possível recebê-lo do outro navio, o Hesperides, na sexta passada. Infelizmente ventos de 25 nós impediram que os zodiacs pudessem ser colocados na água para trazerem a carga até à praia. Após 4 horas de espera o navio teve de zarpar para Punta Arenas de onde nos irão enviar os equipamentos por avião. Seguramente não chegarão até à próxima sexta e isto muda os nossos planos. Afinal a Carmen já não poderá sair a 3 como planeado e tentaremos terminar tudo até 11, quando o Hespérides volta para nos levar até Yelcho, para a segunda fase da camapanha! O problema de momento é alimentar os animais até que possamos receber tudo e inicar. Vamos procurar anfípodes e outras opções junto com os colegas chilenos que estão a fazer experiencias em Escudero com Harpagifer antarcticus e que hoje procuram peixes durante a maré baixa entre pedras no meio de grandes blocos de gelo. Não estamos sós – os pinguins divertem-se e divertem-nos com os seus saltos.
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Saímos pelas 9h00, logo após o briefing matinal com o chefe de base. Dirigimo-nos, eu, o Pedro Pina e o Pedro Ferreira, para a Meseta Norte, um planalto no interior da Península que é também a sua região mais elevada. Na subida para a Meseta fomos reencontrando as nossas companheiras skuas, que já parecem estar a habituar-se à nossa presença, e se mostram menos defensivas e mais curiosas. O tempo apresentava-se perfeito: pouco vento, muito boa visibilidade. Mas também muito frio, sobretudo no topo da Meseta. De tal forma que, depois de dois primeiros voos bem-sucedidos, as baterias do drone arrefeceram demasiado, e este começou a apresentar comportamentos erráticos, com dificuldades de ligação ao controlador. Optámos por isso por guardar todas as baterias em bolsos interiores dos casacos, e fazermo-nos de novo ao caminho, para as aquecer. Descemos a vertente norte da Meseta, na direcção da costa, e encontrámos um enorme campo de círculos de pedra, com mais de 1Km de extensão. Estes círculos formam-se espontaneamente em solos susceptíveis a ciclos de variações térmicas, através de um mecanismo de circulação convectiva da camada superficial do terreno. No interior dos círculos o material mais fino surge à superfície, afastando para a periferia os solos de textura mais grosseira. No local que visitámos, o interior dos círculos apresentava muitas vezes contraste de cor em relação à periferia, dando ainda mais beleza a estes campos. Por esta altura as baterias do drone já tinham aquecido com a caminhada, e pudemos realizar vários voos nesta região. O regresso à base tinha de ser em passo rápido, pois fazia-se tarde! Caminhámos um pouco ao longo da costa, espreitando bonitas praias povoadas por lobos e elefantes marinhos, mas inflectimos rapidamente para o interior, contornado a Meseta pelos seus lados Norte e Oeste, até chegarmos à base, já em cima da hora do jantar. Estávamos os três estafados, depois de um dia inteiro a caminhar (12 km no total) mas muito contentes com o trabalho feito. A seguir ao jantar, como de costume, eu e o Pedro Pina ainda processámos e analisámos algumas das imagens adquiridas durante o dia. Para mim, que estou na Antártica pela primeira vez, este foi o dia em que comecei a sentir-me verdadeiramente à vontade com as condições do terreno. Gosto de caminhar no frio, a neve e o gelo já não me causam insegurança no pisar, e a alma alimenta-se de tanta vastidão e beleza. Parece-me que apanhei o “bichinho da Antártida”…
E ao terceiro dia não deu mesmo para voar. O tempo logo de manhã não estava famoso, verdadeiro contra-senso, pois duvido que haja alguém mais badalado na Antártida do que o tempo. Decidimos na mesma sair da base até à Meseta Norte, pois as previsões indicavam uma melhoria para o fim da manhã. Lá fomos, por lá andámos, à espera da tal melhoria, mas nada, a dita cuja não apareceu mesmo. Depois de bem pingados, decidimos voltar à base a tempo ainda de almoçar. Foi uma higiénica voltinha de mais de 5 km. E bem o fizemos porque à tarde choveu mais, nevou também, soprou uma ventania dos diabos e a neblina caiu até cá abaixo. Foi uma oportunidade para ficarmos na base e começarmos a processar as imagens captadas nos voos dos dias anteriores. É fundamental avaliar já a qualidade da informação captada para, caso seja necessário, fazer correcções. Em suma, é preciso montar as várias imagens individuais num mosaico de maiores dimensões usando métodos de processamento de imagem adequados, testando e escolhendo os parâmetros mais apropriados. Por fim, obtém-se um modelo digital de elevação que permite ortorrectificar o mosaico das imagens. É um processo relativamente moroso, nem sempre fornecendo bons resultados nas primeiras iterações. Por exemplo, é por vezes complicado ‘colar’ as regiões com neve (todas iguais ou muito parecidas), sendo no entanto um processo que se torna bem mais simples quando as pegadas que lá deixamos aparecem nas imagens. Em boa hora apanhados! Mas é sempre com expectativa que esperamos pelo resultado final que, quando atinge a desejada qualidade, nos deixa sempre encantados. Poder ver de cima uma superfície de terreno, que naturalmente nos é inacessível, continua ainda a ser para mim um espanto. Por outro lado, a quantidade de baterias que é sempre necessário pôr a carregar após a vinda da rua não deixa de ser impressionante. E mostra bem a nossa actual dependência da tecnologia. Contei, entre as várias baterias do drone e respectivos comandos, máquinas fotográficas, gps, walkie-talkies ou power-banks, mais de uma dúzia!
O dia 19 Janeiro foi o dia D e representou a entrada da equipa do Projecto Hg-Planktarctic na Península Antártica, juntamente com mais 4 equipas participantes do Programa Polar Português 2016/2017. Apesar de em Punta Arenas o céu estar nublado, o estado do foi melhorando gradualmente ao longo da viagem que durou aproximadamente 2h, e aquando da aterragem na ilha de King George, o tempo apresentava-se como um verdadeiro dia de verão (6 °C), sem vento e com bastante sol, o que resultou nos primeiros escaldões dos participantes lusos. Na ilha pudemos observar os primeiros pinguins que fizeram as nossas delícias e foram objeto de muitas fotos divertidas. Enquanto esperávamos pelo transporte do navio Espanhol, Sarmiento Gamboa, que nos ia levar ao destino final, Deception Island, pudemos visitar a base militar Chilena, a base Escudero, assim como a capela ortodoxa Russa, muito digna de uma visita. O transbordo foi feito com auxílio de Zodiac e teve a duração de aproximadamente 1h, devido à presença de blocos de gelo, o que implicou o uso de um fato seco de um tamanho muito acima do nosso e que nos deu um aspeto muito engraçado. O mar estava sem qualquer ondulação pelo que se tratou de um passeio com direito a observar as brincadeiras dos pinguins que individualmente ou em grupo circundaram o barco. Pudemos observar também uma foca leopardo que descansava calmamente num bloco de gelo. Pelo que a chegada ao Sarmiento Gamboa aonde pernoitamos foi muito agradável e queremos agradecer a simpatia de toda a tripulação que nos acolheu. Pelas 5h da manhã, passamos para um outro navio espanhol, o Hespérides, onde fomos igualmente bem recebidas e passamos uma noite. Este último levou-nos finalmente à ilha Deception, onde fomos admitidas com muito entusiasmo, o que claro nos aqueceu a alma. Agora é montar o nosso laboratório, que veio em 5 caixas de metal e dar início ao nosso primeiro trabalho Antártico.
Pedro Pina, 22 de Janeiro de 2017, Ilha de King George Se há coisa que na Antártida não se pode planear antecipadamente são as actividades a realizar diariamente numa campanha de campo, por causa da Dona Meteorologia ou, para manter a igualdade de género, do Senhor Tempo. Naturalmente que os objectivos devem ser claros, o que se pretende atingir também, assim como a forma de o realizar. Mas sempre a um nível alto, como um todo, sem pensar nos pormenores, com um horizonte temporal largo, da largura da duração da campanha. É depois na execução diária da campanha, conforme as etapas forem sendo ultrapassadas, que se pode pensar no momento seguinte, às vezes no dia que virá depois, mas muitas outras vezes somente na tarde que aí vem. É um pouco como navegar com a costa à vista. No nosso 2º dia de campo, tínhamos previsto voltar à Meseta Norte, mas rapidamente percebemos que a neblina a cobria quase na íntegra. Concluímos que, depois de esperar um pouco, a coisa não deveria alterar-se rapidamente. Olhando para sul, o céu estava um pouco mais limpo e a cobertura de nuvens um pouco mais alta. Ala que se faz tarde, para aí fomos nós, eu, a Sandra Heleno e o Pedro Ferreira, levando connosco uma pequena ‘ração de combate’ para podermos passar todo o dia no campo.
Fizemo-nos novamente ao caminho e, uma vez que a chuva parou e o vento amainou, fomos fazendo vários voos com o drone em áreas com características superficiais distintas, com maior predominância de líquenes ou de musgos e de rochas ou de solos. Foram sempre voos relativamente baixos (30 m de altura e até menos), cobrindo áreas mais pequenas do desejado, porque a neblina não deixava espaço para maiores voos. Apesar de tudo foi um bom dia de trabalho que, no regresso à base, acabou em beleza com a passagem pelas praias dos lobos e dos elefantes marinhos.
Ana David, Equipa PROPOLAR Pelas 10h00 locais, 13h em Portugal, do dia 19 de Janeiro, descolou do Aeroporto Internacional Presidente Carlos Ibáñez del Campo, Punta Arenas, Chile, o voo português, transportando, para a Ilha Antarctica de King George, 64 investigadores e técnicos de Programas Polares de 5 países distintos. A bordo do avião DAP-BAE, estavam 9 investigadores da campanha polar portuguesa PROPOLAR 2016-17, Pedro Pina e Sandra Heleno, do projeto CIRCLAR, Marc Oliva, Jesus Fernandes e David Palácios, do projeto CRONOBYERS, Pedro Ferreira, projeto GEOPERM III, Carla Gameiro e Tania Vidal, do projeto Hg-PLANKTARCTIC, e António Correia, projeto PERMATOMO. O entusiasmo era evidente, em especial para os que pela primeira vez entram em território Antártico. O voo demorou aproximadamente 2 horas, aterrando por volta das 12h no aeródromo de Fildes. Seguiu-se a azáfama do costume... uma rápida sessão fotográfica, ... separação de bagagens, .... coordenação dos passageiros que entram e dos que dão saída no voo de regresso, .... O regresso à cidade de Punta Arenas deu-se ao princípio da tarde. A bordo vinham 45 investigadores e técnicos que finalizavam o seu período de campanha, preparando-se para o regresso a casa. Desta vez, não havia equipas de investigação portugueses a bordo. O cansaço estava patente na maioria dos passageiros... Para alguns, será o fim de uma longa e intensa campanha de quase dois meses de investigação... para outros, em particular para as equipas de apoio técnico, será apenas uma pausa, prevendo regressar dentro de um mês para preparar o encerramento das bases para o período de inverno. Por mais cansaço que haja todos desejam regressar na próxima campanha... É o "bichinho da Antártida", um "ser" resistente que vai acompanhar para o resto da vida!
O voo português é o contributo nacional para a logística internacional na Península Antártica, contando o PROPOLAR com o apoio logístico dos vários programas antárticos parceiros para que os cientistas portugueses possam fazer trabalho de campo na Antártida. Os principais países parceiros na logística na presente campanha são Espanha, Chile, Brasil, Coreia do Sul, Bulgária e Argentina, com quem o PROPOLAR mantém colaboração logística e científica há vários anos.
Depois de termos arranjado um canto e umas mesas para colocarmos os nossos equipamentos e da breve reunião matinal diária do chefe de base com todos os investigadores responsáveis de projectos para se identificar as actividades (e necessidades) do dia, decidimos fazermo-nos ao campo, na companhia do Pedro Ferreira do projecto GEOPERM, que é geólogo do LNEG, e que tem vindo a elaborar a cartografia geológica desta região. Definimos como zona prioritária do nosso projecto a Meseta Norte da Península de Fildes, onde iremos captar imagens de alta resolução com um drone. Interessa-nos conhecer em pormenor o que se passa à escala centimétrica nalgumas superfícies desta ilha que já não têm gelo (que tipo de solo, de rocha, ou de vegetação por exemplo), para depois podermos perceber o que se passa nas imagens de satélite, que já não permitem distinguir tão bem esses tipos entre si (se por exemplo é musgo ou líquen), mas que permitem estudar áreas maiores porque cobrem regiões bem mais extensas. Ou seja, usamos esta região como uma espécie de laboratório natural para conhecer pormenores da sua superfície que depois poderão ser extrapolados para toda a Península Antártica de forma a perceber a dinâmica actual das regiões livres de gelo e a sua relação com as alterações climáticas. Nesta campanha, daremos uma particular atenção a um padrão natural típico das regiões polares, os círculos de pedras, que se forma e evolui pela dinâmica da camada superficial da superfície. Voltaremos aos círculos mais tarde noutros postes quando já tivermos imagens captadas este ano. Apesar de o tempo estar cinzentão, arriscámos sair e esperar que abrisse um pouco. E assim foi. Voltei à Meseta Norte cinco anos depois. Após uma caminhada de uns bons 2 km desde a base, fizemos um breve reconhecimento e dirigimo-nos para o primeiro ponto de trabalho que tínhamos escolhido no nosso planeamento para prepararmos os voos com o drone. Fizemos somente 2, depois de abrir ligeiramente. Foi curto, pois tínhamos previsto fazermos 5, mas o tempo não permitiu mais a partir de determinada altura. A neblina começou a baixar, o vento a soprar um pouco mais forte e também a nevar. Decidimos regressar à base. Foi pouco mas correu bem, permitindo também avaliar o comportamento do drone que ainda não tinha sido usado aqui em Fildes. Amanhã também haverá dia. E eles são bem longos por aqui nesta altura do ano. Hoje chega o voo fretado pelo PROPOLAR. Nele vêm portugueses mas sobretudo muitos investigadores de outros países. E nele saem também outros tantos, incluindo dez chineses. Este voo é a contribuição portuguesa para a logística antárctica. Nós vamos espera-lo ao aerodromo Teniente Marsh, para receber os Pedros, o Pina e o Ferreira e a Sandra, que ficarão na base chilena Escudero, o António que partirá com os coreanos para King Sejong e a Carla e a Tânia que vão embarcar no Sarmiento de Gamboa com destino à base espanhola Gabriel de Castilla, na ilha Deception. Tirámos as fotos da praxe e os portugueses vão de caminho até à praia de Fildes.
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