DIÁRIOS DE CAMPANHA
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É sempre incrível como a época de campo parece voar. São voos no sentido figurado, não no literal, como os mais de 6000 km que os Maçaricos-galegos (Numenius phaeopus islandicus) são capazes de fazer entre a Islândia e o Oeste africano, sem uma única paragem! São esses voos e as consequências que podem ter na qualidade individual das aves que regressam ao ártico cada ano para de reproduzir, que estamos a investigar. Para isso usamos geolocators (sobre os quais pode ler aqui: http://www.propolar.org/notiacutecias2013-2017/projeto-geowhimbrel-geospoi-de-volta-entre-o-artico-e-os-tropicos) e quantidades consideráveis de nervos e paciência em doses nem sempre equilibradas (http://www.propolar.org/blog-2016-2017/geowhimbrel-ii_01-geospoi-um-jogo-de-paciencia-e-nervos).
Toda a informação é importante, desde as datas de postura dos ovos, que poderá estar relacionada tanto com a estratégia migratória como o sucesso reprodutor, até à contida nos minúsculos geolocators que indicam as rotas seguidas, os tempos de partida e chegada e a duração dos voos. Talvez essa seja a mais interessante, se calhar por ser uma surpresa, já que só saberemos os movimentos depois de recuperar os aparelhos e descarregar os dados, mas também por nos permitir relacionar as várias etapas do ciclo anual destas aves e investigar se, e como umas afetam as outras de forma consecutiva. Por exemplo, será que aves que chegam à Islândia mais tarde, se reproduzem também mais tarde, tendo as suas crias menos tempo para crescer e aprender a voar antes que cheguem as baixas temperaturas? Será que aves que partiram mais tarde no ano anterior (porque tiveram sucesso na reprodução) tendem a chegar mais tarde no seguinte? E no entanto, essa enorme quantidade de dados, com localizações diárias ao longo de 9-10 meses, cabe na palma de uma mão! Esta época conseguimos recuperar vinte geolocators (o melhor ano de sempre, nesta frente!), que nos dirão quando e por onde migraram estes vinte Maçaricos-galegos. Adicionalmente, várias destas aves foram já seguidas em anos anteriores, o que nos permite perceber se os mesmos indivíduos repetem as suas rotinas ao longo dos anos e quão plásticos conseguem ser (tanto no tempo como no espaço), que é informação essencial face às rápidas alterações globais. Um desses indivíduos é seguido anualmente desde 2012, e sobre ele sabemos já quando, como e para onde migrou em quatro anos consecutivos. Estamos de momento a aguardar a extração dos dados contidos no geolocator que transportou no último ano para que “abra a mão” dessa informação e possamos conhecer mais um pouco do seu historial de vida.
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Os minúsculos aparelhos que usamos para investigar as migrações dos Maçaricos-galegos (Numenius phaeopus), denominados geolocators, e que registam as suas posições (de forma indirecta), infelizmente não as transmitem. Assim, temos de os recuperar, recapturando para isso o mesmo Maçarico-galego um ano após a colocação do geolocator para conhecer as estratégias migratórias destas aves. Parece simples, mas não é! Ou, pelo menos, não é nada fácil… Os Maçaricos-galegos são fieis ao local de reprodução, por isso, após um ano de os capturarmos, marcado individualmente com anilhas coloridas e colocado um geolocator, sabemos onde os podemos encontrar no ano seguinte, para os tentarmos recapturar e ficar finalmente a conhecer os seus movimentos. Continua a parecer simples. A técnica consiste em capturar as aves enquanto elas incubam os ovos, usando para isso uma spring trap, comumente utilizada em estudos com estas aves. O período de incubação do Maçarico-galego decorre durante 25-27 dias, portanto, de forma a maximizar o tempo disponível de captura tentamos encontrar os ninhos o mais cedo possível. Uma vez sabendo a localização do ninho, podemos tentar capturar as aves. O tempo da primeira captura de um indivíduo é reduzido, cerca de 10-15 minutos. Mas os Maçaricos-galegos são mais cuidadosos e parecem aprender que algo está diferente no ninho quando fazemos uma nova tentativa, com a spring trap. Muitas vezes as nossas tentativas falham porque a ave não se deixa capturar e após algum tempo retiramos a spring trap, a ave volta ao ninho e nós voltamos a tentar uns dias depois. Em 25-27 dias de incubação, parece não haver problema em tentar novamente mais tarde, já que é uma janela temporal larga. Mas há! Na Islândia existem vários predadores que se alimentam dos ovos de Maçarico-galego e outras limícolas, por exemplo a Raposa-do-ártico (Vulpes lagopus) ou os Moleiros-pequenos (Stercorarius parasiticus), e caso o ninho seja predado, não existe alternativa para recapturar a ave, o respectivo geolocator e os dados nele contidos! Nas últimas semanas já observamos 35 indivíduos com geolocator e alguns ninhos foram encontrados. Além disso, nos mais adiantados, as tentativas começaram a ser feitas e nove geolocators foram recuperados! Estamos impacientes para saber quais as estratégias migratórias destes indivíduos, mas sobretudo muito ansiosos para recuperar os restantes, neste jogo de paciência e nervos! Depois de mais um rápido inverno, estamos de volta à Islândia, à espera dos “nossos” GeoSpoi. O plano para esta época de campo tem como principal tarefa a recuperação de geolocators colocados nos Maçaricos-galegos (Numenius phaeopus islandicus) em 2015 e 2016 e a colocação de mais. Até à data já registamos o regresso de 22 indivíduos com estes pequenos data-loggers, incluindo um de 2015 que no verão anterior esteve ausente das áreas de estudo. Se tudo correr bem, vamos aumentar consideravelmente a nossa amostra inter-individual, mas também intra-individual e perceber o que se passou com aquela ave no verão passado: esteve noutro local da Islândia? Não migrou nesse ano? Além deste caso, ficaremos também a conhecer as migrações de mais indivíduos e quão variáveis são as rotas de cada um deles ao longo dos anos. Será que o mesmo Maçarico-galego altera a sua estratégia de migração de ano para ano? Caso não o faça, quão consistente é nas suas rotinas anuais? Realiza as migrações sempre nas mesmas datas? E que consequências pode ter essa potencial flexibilidade para o seu sucesso reprodutor? Em breve teremos dados para responder a estas perguntas! A maior parte das aves seguidas em anos anteriores fez uma paragem na Irlanda durante a migração primaveril no seu trajecto para o ártico. Por isso, esta primavera decidimos fazer o mesmo e passamos a última semana de Abril no sul da Irlanda. Com o importante apoio de colegas locais, capturamos alguns Maçaricos-galegos que foram marcados individualmente com anilhas coloridas e recolhemos também algumas amostras biológicas. Além disso, fizemos observações do comportamento alimentar e recolhemos presas (caranguejos, principalmente) para relacionarmos a quantidade de alimento ingerido em paragem migratória com os gastos energéticos da migração precedente (desde Africa até a Irlanda) e da consequente (desde a Irlanda até a Islândia). Em breve teremos novidades sobre que indivíduos regressaram às suas áreas de reprodução no ártico voando sem parar entre África e Islândia ou fazendo dois voos distintos com uma paragem na Irlanda! |
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