Catarina Guerreiro e Afonso Ferreira, 2019-JAN-30 ao largo da Península Antártida, a bordo do navio polar da Marinha Brasileira " Almirante Maximiano" As últimas semanas de Janeiro de 2019 foram passadas a monitorizar o ambiente marinho envolvente ao norte da Península Antárctica. A bordo do Navio Polar Almirante Maximiano, trabalha-se por turnos de 12 horas de forma a rentabilizar ao máximo o tempo de navegação e de amostragem desta região tão diversificada quanto remota. A coluna de água tem sido amostrada praticamente todos os dias desde o início dos trabalhos, para investigar a distribuição da biomassa e composição das comunidades fitoplanctónicas, incluindo os biogeoquimicamente importantes cocolitóforos (fitoplâncton calcário). Para além dos perfis verticais de temperatura, salinidade, oxigénio e fluorescência da coluna de água marinha obtidos através do CTD (Conductivity, Temperature, Density), estão também a ser realizadas colheitas de água para o estudo dos macronutrientes, assim como medições “underway” (i.e., em contínuo) do pH e dos fluxos de CO2 entre a atmosfera e a superfície do oceano. Em regiões-chave, recorre-se ao sistema MultiNet e à rede manta para colher amostras de zooplâncton marinho e de microplásticos. Para além das equipas da física, química e fito- e zooplâncton, o GOAL (Grupo de Oceanografia de Altas Latitudes) também conta com um grupo de oceanógrafos especializados no estudo de baleias. A par das suas longas vigílias, ao frio, para observar/quantificar as diferentes espécies que habitam esta região tão produtiva quanto vulnerável, os nossos “baleeiros” (como carinhosamente lhes chamamos) também se aventuram no mar aberto. Quando as condições de ondulação e visibilidade são favoráveis, a destemida equipa sai de bote para observar estes magníficos mamíferos marinhos mais de perto, gravar os seus sons, e colher biópsias da pele e gordura para posteriormente fazer estudos de genética, taxonomia, isótopos estáveis e concentração de contaminantes (ver Seyboth et al., 2018). Imagem 3. A nossa equipa de “whale-watchers” em ação para mais uma saída de bote. No canto superior direito (da esquerda para a direita), os oceanógrafos Renan Lima (FURG), Jonatas Prado (Instituto Baleia Franca), Manuela Bassoi (Universidade Federal do Rio Grande do Norte) e Elisa Seyboth (Universidade de Cape Town). Porquê este interesse na Península Antártica? Esta região é influenciada por uma das mais rápidas taxas de aquecimento climático à escala global, sendo considerada um “hot spot” natural para monitorizar alterações do ecossistema marinho relacionadas com o aquecimento dos oceanos. Um bom exemplo disso é o Estreito de Bransfield, uma importante região de formação e exportação de massas de água densas e profundas para as áreas circundantes e para o oceano global (Ferreira e Kerr, 2017). Estudos recentes nesta área sugerem que estão a ocorrer fortes alterações nas condições de gelo marinho e um aumento do colapso de camadas de gelo (Cook et al., 2016), por influência da entrada de massas de água intermédias mais quentes e salinas formadas a partir da Corrente Circumpolar Antárctica (Barlett et al., 2018). A redução de cerca de 90% dos glaciares na parte ocidental da península (Cook et al., 2016) parece estar a afetar todos os níveis da cadeia alimentar marinha, desde as comunidades de bactérias Archaea, passando pelos produtores primários (fitoplâncton), krill (zooplâncton), até aos predadores pelágicos marinhos (Ducklow et al., 2007).
Uma das mais recentes descobertas do GOAL diz respeito, precisamente, ao aumento da abundância de criptófitas (fitoplâncton nanoflagelado) em detrimento das diatomáceas (e.g. Mendes et al., 2018). As diatomáceas são o alimento preferencial do krill, que é, por sua vez, a principal fonte de alimento das baleias. Logo, a sua redução em benefício das criptófitas tem o potencial de alterar toda a teia trófica marinha pelágica na Península Antártica. Um dos objetivos desta expedição é, precisamente, investigar a relação entre a biomassa de criptófitas e o aumento da estratificação da coluna de água causado pelo degelo, para avaliar a persistência destas tendências observadas em expedições anteriores. E é também essa a parte mais interessante de colaborar com o GOAL: este grupo de investigação lida com o impacto das alterações climáticas no ecossistema marinho pelágico como um todo, desde os produtores primários até aos mamíferos marinhos. Esta abordagem interdisciplinar é crucial para desenvolver uma perspetiva holística dos processos biogeoquímicos, ecológicos e oceanográficos que aqui vigoram, quer espacialmente, quer ao longo do tempo.
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Catarina Guerreiro e Afonso Ferreira, 2019-JAN-21, Estreito de Bransfield, Antártida, a bordo do navio polar da Marinha Brasileira " Almirante Maximiano" A nossa aventura na 37ª OPERANTAR, uma expedição co-organizada pelo Programa Antártico da Marinha Brasileira (PROANTAR) e pela Universidade Federal do Rio Grande (FURG), já começou no início de Janeiro, mas só agora conseguimos um pouco mais de tempo (e de wi-fi!) para dar notícias. É com muito entusiasmo que estamos a trabalhar em colaboração com o Grupo de Oceanografia de Altas Latitudes (GOAL) da FURG, no contexto do projeto PHYTO-NAP (Phytoplankton response to climate trends in the Northern Antarctic Peninsula) financiado pelo Programa Polar Português (PROPOLAR). A equipa é simpática e competente, e já conta com 15 anos de monitorização do ambiente marinho envolvente à Península Antárctica (para mais detalhes, ler o Special Issue of Deep-Sea Research II, Kerr et al., 2018). Foi no dia 3 de Janeiro que zarpámos de Punta Arenas (Chile) rumo ao sul, no Navio Polar Brasileiro Almirante Maximiano. Depois de atravessarmos os deslumbrantes canais patagónicos Chilenos e Argentinos, chegámos à Passagem de Drake com alguma expectativa de nos depararmos com uma navegação mais difícil, tendo em conta a força das correntes e da ondulação que aqui tipicamente se faz sentir. A travessia até à Península Antártica fez-se, no entanto, sem problemas. O navio balançou um bocado mais, levando alguns dos nossos parceiros de viagem a “marear” ou a refugiar-se durante mais tempo nos respetivos camarotes. Mas os três Portugueses a bordo (imagem 1) resistiram ao balanço, permanecendo despertos e entusiasmados aquando da entrada triunfal na Zona Antárctica, ao atravessar os 60º S. Após entrar em território Antártico, o navio fez uma paragem de logística na Estação Antárctica Brasileira Comandante Ferraz, localizado na Ilha King George. Não desperdiçámos a oportunidade e fizemos uma visita guiada até à estação, junto à qual jaz uma réplica de ossada de baleia Jubarte que ali foi construída com ossos de várias baleias por Jacques Cousteau, algures na década de 1960. Fomos muito bem recebidos na estação Brasileira e ainda tomámos um chocolate quente (muito doce!!) que nos animou o espírito e aqueceu o corpo do frio cortante que estava lá fora. A caminho do Estreito de Bransfield – a primeira região que amostrámos na Península Antárctica – ainda passámos muito perto da Deception Island, uma ilha cuja topografia é marcada pela presença de uma cratera de vulcão. Aos sábados, os trabalhos são acompanhados de música festiva em pano de fundo, porque é dia de churrasco no navio Brasileiro. Nestes dias, o frio de rachar antártico contrasta com o ambiente de samba e boa disposição dentro do navio. São muitos meses embarcados no frio polar para estes marinheiros. É preciso fazer por passar melhor o tempo J Ao longo das próximas duas semanas vamos procurar fazer um apanhado dos principais locais e atividades desta jornada! Até já e saudações do “Tio Max”, como o navio é apelidado carinhosamente pelos marinheiros. Imagem 7. Cumplicidade a bordo, com a Deception Island em pano de fundo. Da esquerda para a direita: Raquel Avelina (oceanógrafa, Universidade do estado rio de janeiro), Catarina Guerreiro (Geóloga Marinha, MAREFCiências. ID), Renan Lima (oceanógrafo, FURG), Camila Signori (oceanógrafa, Universidade de São Paulo). |
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