A CAMPANHA
PROPOLAR 2011-2012
Novembro de 2011 a Abril de 2012
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Dia 10 Dezembro 2011. Pela manhã vestimos os Vikings (fatos de sobrevivência) e subimos para os Zódiacs (semi-rigidos). Estava um dia típico de Deception Island, muito vento, e muita humidade. O Zodiac tinha como destino vários pontos da baia e os cientistas saiam e entravam em cada paragem. Eu sairia em Murature para recolher os dispositivos que tínhamos deixado no mar junto às praias. 2 deles desapareceram... Foram levados pelas correntes e pela subida da maré.
Teríamos de voltar a instalar novos dispositivos, e tentar arranjar poitas e bóias mais eficientes. Depois de recolher o único dispositivo que sobreviveu à intempérie Antárctida, o semi-rigido regressou à minha estação e continuámos o roteiro. A próxima paragem era o refugio chileno, que funcionava como guarida quando a base chilena estava operacional. Teresa e Pepe, que ajudaram a remendar a bandeira de Portugal há dias atrás, desembarcaram e levaram baterias carregadas para as estações sismológicas. Ao sair do Zodiac, uma foca de Weddell esperava por nós em cima de uma placa de gelo. Estava numa ronha de fazer inveja, só gastava energias para se espreguiçar, bocejar e abrir de vez em quando um olho para nos tirar a pinta. Entramos no Zodiac e partimos todos em direcção à antiga base chilena. Luismi, um jovem cientista precisaria de instalar uma estação GPS junto a um inclinómetro e sensor sísmico. Naquela praia abundavam fumarolas, fazendo daquela parte da baía um cenário perfeito para um filme de terror: fumo rasteiro por todo o lado, e atrás os escombros da antiga base. Em 1969 o vulcão de Deception acordou e bombardeou a base chilena de piroclastos até ficar praticamente toda soterrada, teríamos por isso de andar com muito cuidado e atrás uns dos outros. Debaixo dos nossos pés havia espaços ocos do tamanho de salas que poderiam abater a qualquer momento. Ao regressar à base fazia os planos para a colheita de amostras no rio Mecon quando reparei numa placa de gelo do tamanho de uma foca dentro do Zodiac. Perguntei ao DOC (militar médico) para que serviria. "Para la fiesta de esta noche! Hoy es sabado!" Claro, para que é que havia de ser, eles não perdoam. Os pormenores da festa não os poderei contar, ficam à vossa i m a g i n a ç ã o . André Mão de Ferro & João Canário Dia 9 Dezembro 2011 Aqui na base, estar de maria significa desempenhar todas as funções domésticas para que o nível de conforto na base se mantenha constante, ou seja óptimo. Este cargo é rotativo entre todos, e por dia há sempre um par de marias, uma maria militar, e uma maria cientista. Um costume engraçado por aqui é os marias terem sempre um pequeno toque personalizado e organizarem pequenas surpresas, teatros ou brindes. Decidi por isso fazer panquecas para o pequeno almoço, estavam boas, mas o bacalhau estava melhor. Acumularam-se 22 panquecas numa pilha enorme, e amoleceram um pouco. Formei parelha de maria com o Aitor, um militar veterinário extremamente eficaz e hiperactivo neste serviço. Depois de arrumar e lavar a loiça do pequeno almoço, esfregámos o chão e limpamos os WC's. O João aproveitava para fazer futuros planos de trabalho e claro tirar umas fotos! É uma experiência muito interessante e fortalece os laços de entre ajuda e camaradagem entre todos. No final do dia o cansaço era enorme. Assim que acabamos de esfregar o chão da cozinha e as mesas do jantar, entregamos os aventais de maria aos marias do dia seguinte e fui dormir. Amanhã era dia de muito trabalho! André Mão de Ferro e João Canário [CONTANTARC] Trabalho de campo em Moreture, na zona mais a Norte da baia de Deception Island8/12/2011
Dia 8 Dezembro 2011 Partimos de manhã nos barcos semi-rígidos em direcção a Moreture. Fica numa zona mais a Norte da baia de Deception Island. Uaaau que bonito, uma praia com ravinas salientes e rochas enormes mergulhadas na areia. Por toda a costa se vêm estratificações fascinantes e criou-se um cenário muito misterioso principalmente depois de o barco se ter ido embora e termos ficado isolados a trabalhar nessas praias. A maré estava baixa mas mesmo assim tínhamos de passar para a praia seguinte por um túnel de rocha natural. Visto daquela perspectiva era realmente notório as semelhanças com as praias algarvias, nomeadamente a praia da Rocha.
Havia algumas aves no cimo das ravinas e a água da baia borbulhava devido à lava do vulcão que se encontra debaixo dos nossos pés apenas a 1,5 km de profundidade. Isto explicou-me a vulcanologa Teresa que coseu a bandeira portuguesa no outro dia. Entrámos para a baia com os vikings (fatos de sobrevivência obrigatórios para quem se desloca de semi-rigidos) até termos água até aos joelhos para instalar um dispositivo (DGT) e aproveitei para filmar uma coluna de borbulhas de gás que saía da areia quando, de repente, dois pinguins apareceram a nadar ao pé de nós. Apareceram à nossa direita na margem e com toda a calma vinham à tona de água e mergulhavam novamente, depois reapareciam um pouco mais afastados da costa e um pouco mais á esquerda para nos verem de outro ângulo. Estavam nitidamente muito curiosos com o aparato todo nesta terra de eterna pasmaceira. Claro que os filmei! Foi um timing perfeito! =) À tarde fomos novamente ao Mecon retirar amostras. Uma parte do leito estava completamente rasgado pelos diversos cursos de água e criava múltiplas formas. Desta vez tínhamos a companhia de Craig, o americano microbiologista perito em filogenética que conhecemos em Ushuaia antes de embarcar no Las Palmas. Enquanto recolhíamos amostras falávamos das experiências do João no Artico e das aventuras de Craig no monte Erebus, um vulcão activo perto de Ross Island, Antárctica. André Mão de Ferro e João Canário Clique aqui para editar Dia 7 Dezembro 2011 "Mira que bueno el bacalao!" Depois de horas a descascar cebolas (com ajuda de óculos de neve), cozer e desfiar bacalhau, descascar e fritar batatas e calorosas discussões pelas melhores opções de confecção, o bacalhau à Brás feito por mim e pelo João prometido para hoje ficou uma delicia e superou as expectativas. Fazer um bom bacalhau à Brás pode não parecer muito difícil, mas fazê-lo para 19 espanhóis, 1 americano e 2 portugueses é um desafio e pêras. Além disso o que estava em causa não só era dar de comer a esta gente toda para o almoço, mas sim honrar a fama que o bacalhau à Brás tem por todo o mundo. Antes de comer, juntamos todos os copos: "Un brindis por Portugal, VIVA!!" O aspecto do bacalhau estava óptimo, mas confesso que ficamos mais babados com os elogios que recebemos. Que satisfação!! Todos adoraram e muitos garantiram-nos que nunca tinham comido um bacalhau tão saboroso. Mesmo em Portugal... Não fiquei muito bem na foto porque na verdade estava a queimar-me no tacho! hehe De qualquer forma é a única que tenho por isso.. Pela tarde fomos novamente ao rio Mecon recolher amostras. O gelo continua a derreter e a provocar imensas alterações no leito do rio. De repente ouviu-se um CRAAAAKKKK! A placa de gelo junto à margem do Mecon por onde o João estava a caminhar rachou e caiu. Nesse preciso momento estava a tirar uma foto em direcção à foz do rio e captei o momento! André Mão de Ferro e João Canário Dia 6 Dezembro 2011 As mudanças do rio Mecon com o passar do tempo são fascinantes. As paredes de gelo derretem a todo a tempo e estão em permanente derrocada. O leito do rio ganha cada vez mais força à medida que o gelo derrete e as margens do rio afastam-se de dia para dia. No primeiro dia de recolhas tínhamos colocado 3 estacas ao longo do vale para marcar os postos de recolha. Hoje a segunda estaca desapareceu. As margens estão em permanente derrocada e calculamos que a estaca esteja coberta de sedimentos no leito do rio. Fizemos a recolha de amostras e posterior tratamento no laboratório da base. No dia seguinte esperáva-nos uma manhã de grande responsabilidade: Fazer o prometido bacalhau à brás para o almoço para toda a equipa de Gabriel de Castilla. André Mão de Ferro e João Canário, Deception Durante o dia fomos buscar os dispositivos que tínhamos colocado dois dias antes na baía aqui mesmo junto à base. O nosso receio era de que a bancada de gelo vinda das praias de oeste os tivessem esmagado.
Felizmente estavam em bom estado, mas o gelo entretanto tinha derretido e baixou a salinidade das águas da baia. Infelizmente teríamos de voltar a repetir a experiência. Os planos aqui mudam como o tempo, num piscar de olhos! Regressamos à base e planeamos o dia seguinte. Teríamos de fazer as recolhas de amostras diárias de água no rio mecon, e procurar uma alternativa para a colocação dos dispositivos na baia. A um determinado momento a ponta da bandeira ficou presa no poste, e no final do dia dois militares foram discretamente remediar a situação. O caso era complexo e tiveram que a tirar para a remendar. "Teresa estás cosiendo la bandera del enemigo??" Perguntava Pepe na brincadeira, o marido de Teresa. São ambos vulcanólogos espanhóis veteranos nestas andanças e formam o casal mais catita da Antárctida. Eu e a Teresa passamos o serão à conversa e a remediar as pontas rasgadas. Enquanto a Teresa cosia a bandeira falámos das inúmeras batalhas entre portugueses e espanhóis em especial da grande batalha de aljubarrota. André Mão de Ferro e João Canário Hoje começamos por ir às fumarolas.
Um dos nossos objectivos deste projecto é, para além de definir os processos de transporte de contaminantes, também identificar as fontes. A vantagem da ilha de Deception é ser de origem vulcânica com vulcanismo activo. Este aspecto é muito importante na medida em que estes fenómenos naturais contribuem para a introdução de muitos metais pesados no ambiente. Daí termos aproveitado a nossa estadia para recolher amostras nestes locais para em laboratório determinar as concentrações de alguns dos mais importantes. Desta forma, estivemos toda a manhã a recolher amostras de água e solo nestas fumarolas para depois serem processadas em laboratório e analisadas em Lisboa. A recolha de amostras de água foi mais complicada pois numa das fumarolas a água estava a 75ºC e na outra 90ºC. Da parte da tarde fomos fazer o reconhecimento do rio Mecon. O nosso objectivo ao estudar este rio é ver de que forma alguns elementos se distribuem pelo gelo e pela água e de que forma é que o degelo contribui para o input (ou não) desses elementos na coluna de água e, se esse processo está associado ao teor e natureza do carbono orgânico (dissolvido e/ou partículado) ou simplesmente à natureza das partículas existentes no gelo ou na água. O trabalho da tarde foi unicamente reconhecer os locais e definir três estações de amostragem que foram identificados por GPS e assinaladas no local com uma estaca. Aproveitamos ainda para visitar o Lago Zapatilla onde é feita a recolha de água doce que abastece a base. " E pronto. Vou continuar o meu trabalho de Maria que não paro desde as 9. João Canário e André Mão de Ferro O primeiro dia na base foi intenso. Não se ia trabalhar pois connosco tinha chegado muito material para a base e os militares tinham de pôr tudo em ordem. Sim, a base Gabriel de Castilla é militar. No entanto, aproveitamos para montar o nosso laboratório, fazer brancos, calibrações etc. Aproveitamos sobretudo para nos inteirar da vida da base.
Mas primeiro, ainda hastearam a nossa bandeira á entrada da base. O André trouxe muito solenemente a bandeira nos braços e um militar hasteou-a. Foi um momento emocionante. E na verdade é um mundo diferente. Mesmo muito diferente da minha experiência no Árctico. É no entanto uma experiência de vida fascinante. O trabalharem 24 pessoas para o bem comum sem stresses é algo que infelizmente não se está muito habituado. Depois há a figura do(a) Maria, alguém que está escalonado (cientista ou militar) para limpar a base, casas de banho, serviço à cozinha, servir à mesa etc. Uma experiência interessante mas muito cansativa. Ao final do dia há reunião com o comandante da base para preparar o dia seguinte e no nosso caso ir para o lab pois iríamos sair para as fumarolas às 9 da manhã. _O embarque foi no dia 28 pela tarde. Estávamos apreensivos pois o que nos contaram da travessia do Drake não era muito agradável. Íamos preparados para o pior e com os comprimidos para o enjoo a postos. Nas primeiras três horas tudo correu bem e achamos que nos tinham assustado. Vai ser "canja". Na verdade não tinhamos era previsto que ainda demoraria a passar o Beagle Channel. Quando saímos tudo se recompôs. Comprimidos logo. E foram três dias assim. Praticamente sempre deitados. O André armou-se em forte e não quis tomar no primeiro dia e o resultado foram as primeiras 24h horríveis com direito a injecções e tudo. Felizmente a minha experiência embarcado nos navios do IPIMAR me serviu de muito.
Assim foram três dias entre a cama, a sala dos "cientificos" e a ponte. E foi aí que vimos icebergs. Visão fantástica. Com os binóculos víamos pinguins no topo do iceberg. A Antárctida aproximava-se e a excitação aumentava. Desembarcaríamos no dia a seguir. João Canário De partida para Deception, hoje dia 28 de Dezembro de 2011, da parte da tarde.
As últimas despedidas de Ushuaia pois quando regressar-mos aqui será para ir directo para o aeroporto. Fica a vontade de regressar ao Fim do Mundo. No entanto, a expectativa de chegar à Antárctida é muito muito maior. Esperam-nos três dias de viagem através do estreito de Drake que se adivinham muito atribulados. Ondas de 10m e claro, comprimidos para o enjoo a postos. Voltaremos a dar notícias da BAE Gabriel de Castilla." |
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