![]() Gutten morgen!!! Em ciência, é essencial fazer investigação internacional e multidisciplinar. Hoje em dia, com os avanços da tecnologia e da qualidade das pessoas (aqui estou a pensar de como é mais fácil ir a qualquer parte do mundo de avião e da era da internet), faz com que possamos saber quais são os últimos resultados científicos de uma determinada área de investigação rapidamente, quais são as conferências internacionais que vão ocorrer no próximo ano, e claro, quais as equipas e institutos/Universidades que fazem a melhor ciência. Na verdade, a ciência possivelmente irá mudar mais nos próximos 50 anos do que nos últimos 400 anos. Há que estar preparados... Ser cientista hoje, na minha perspectiva, baseam-se em três fortes pilares: ciência de excelência, ligar a ciência a decisões políticas (“policy making”) e a educação. Todas estas vertentes precisam de um contexto muito forte de colaborações internacionais e reunindo cada vez mais diferentes disciplinas, abordando questões cientificas que tenham importância significativa, e que tenha eco na sociedade (desde aquela aplicada à conservação até desenvolver técnicas que abram novas áreas da ciência, mesmo que agora ainda não saibamos se possa ter aplicabilidade direta na sociedade; na verdade, basta ler os livros de Carlos Fiolhais para perceber que muitas das descobertas científicas do passado, inicialmente não tinham aplicação...mas que hoje são fundamentais para a nossa vida diária). Neste contexto, colaborar com outros institutos de investigação, e trabalhar com outros colegas, é muito importante pois a troca de conhecimentos, aperfeiçoamento de técnicas, o colaborar conjuntamente, produzirá (em principio) melhores resultados...tal como dizemos na gíria “duas cabeças pensam melhor do que uma!”. O Alfred Wegener Institute (AWI) (Bremenhaven, Alemanha) é um dos institutos de investigação líderes em ciência polar. Ele possui toda a infraestrutura e logística necessária para fazer ciência de excelência polar. Alfred Wegener foi um cientista alemão que propôs a teoria da deriva das placas continentais (continental drift theory), em que defende que os continentes estão em constante movimento há milhões de anos, e vão continuar a mover-se. Daí sabermos que há mais de 180 milhões de anos a Antártida estava mais a norte e tinha florestas verdejantes, e há cerca de 50 milhões de anos estava ligada à América do Sul. Foi mais recentemente que a Antártida se separou desse continente e fez que forma-se a Corrente Circumpolar Antártica no Oceano Antártico, ligando os Oceanos Atlântico, Indico e Pacífico, e fizesse com que a Antártida se torna-se no continente que é hoje: o mais frio, mais alto e mais seco do mundo! Tal como Alfred, hoje existem cientistas no AWI (por acaso não conheço nenhum Alfred) que contribuem significativamente para a ciência que se faz hoje nas regiões polares... por isso estou aqui! Gutten morgen! 5 Mar, Ilha De Rei Jorge, Antártida
O Martelo é o maior aliado de qualquer geólogo e por isso mesmo o seu símbolo. Sem ele não se consegue ver a rocha no seu estado mais conservado, sem o trabalho dos agentes erosivos. Alem do martelo, fazem parte do material necessário em campo uma bússola, um GPS, uma lupa, o mapa da área em estudo, caderno de campo, sacos para recolha de amostras... O projeto GEOPERM do qual eu faço parte é um projeto de geologia, como tal estudam-se as rochas que por aqui existem e todas elas são de origem vulcânica (certamente que na altura em que se formaram, à cerca de 50-60 milhões de anos as coisas eram bem mais quentinhas por aqui). O vulcanismo da Ilha de King George é um pouco diferente do que geralmente caracteriza um arco de ilhas vulcânicas localizado no oceano e que tem origem em crosta oceânica. Pelo contrário, este processo vulcânico teve como raiz a crosta continental pois no momento em que se iniciou, as ilhas Shetland do Sul estavam ligadas à Península Antártica. A sua separação ocorreu apenas há 4 milhões de anos com o início da abertura do estreito de Bransfield. Este projeto tem como objetivos: fazer a cartografia geológica e litológica (tipo de rochas e estrutura e textura das rochas) da Meseta Norte; recolher amostras para análise geoquímica posterior que nos poderá dar informação sobre a história da formação do arco vulcânico e que tipo de magma deu origem a estas rochas e finalmente obter dados que nos permitam tirar alguma conclusão sobre o impacto das características térmicas da rocha na variação do permafrost (solo gelado). É aqui nesta área da Antártida que o permafrost tem tido maiores alterações uma vez que também é aqui que se fazem sentir mais fortemente os efeitos das alterações climáticas devido ao aquecimento global. Perceber se há alguma ligação entre o tipo de rochas e a variação do permafrost irá permitir ajustar melhor os modelos usados para que as previsões quanto à variação do permafrost sejam cada vez mais seguras. Patrícia Azinhaga com Pedro Ferreira ![]() A educação e a divulgação científica deveriam ser, na minha opinião, uma das componentes obrigatórias de qualquer projeto científico. As vantagens são recíprocas. A sociedade além de estar mais informada sobre um determinado tema e consciente de como está a ser aplicado o financiamento científico público, especialmente em Portugal, pode ter um papel mais crítico (entenda-se construtivo) e activo devidamente fundamentado. Relativamente às questões sociocientíficas actuais é evidente a urgência de uma sociedade mais sosiopoliticamente activa com argumentos validados cientificamente. Quanto aos cientistas, têm a possibilidade de desenvolver competências de comunicação e são na maioria das vezes desafiados a olhar de perspectivas distintas para o trabalho científico que desenvolvem. Alem disso estarão a contribuir para uma sociedade mais consciente e interessada na ciência. Portugal tem sido um bom exemplo na E&O (Education and Outreach, como é conhecida internacionalmente a educação e divulgação científica) na área da ciência polar. O programa Polar Português – Propolar, têm um projecto educativo – o Educação Propolar, e todos os cientistas que participam nas campanhas científicas contribuem para o blog do Propolar partilhando as suas experiências. Portugal é também um dos países que desenvolve mais intensamente a Semana Polar Internacional, um projecto de E&O da Association of Polar Early Career Scientists (APECS) e da Polar Educatores International (PEI) e que ocorre duas vezes no ano, na altura do equinócio da Primavera e do Outono. A minha colaboração quer nos diversos projetos quer nas referidas organizações tem sido constante! Alem de estar a contribuir para uma melhor sociedade é algo em que acredito e que me dá um enorme prazer, logo a E&O tinham de fazer parte desta minha experiência por terras antárticas. Além do que vou partilhando aqui no blog já falei através do skype com cerca de uma centena de alunos do Externato Cooperativo da Benedita e já tenho outras duas sessões agendadas com outra escola. É sempre uma alegria e a questões são inúmeras e muito interessantes. Os miúdos pensam sempre em coisas que não nos passa pela cabeça! Mas, além da emoção dos alunos, uma das coisas que mais me surpreendeu foram os comentários dos outros cientistas que se encontravam aqui na sala. “ Que interessante... aprendi tanto ouvindo as respostas às questões dos alunos....que atividade tão didática...” foram alguns dos tais comentários. Concluo assim que nunca temos bem a noção do impacto que podemos ter e seria muito importante que os cientistas tivessem mais consciência de tal facto. Os professores têm esta noção bem mais desenvolvida e termino agradecendo-lhe os facto de proporcionarem estas oportunidades aos seus alunos, em especial à Paula Arraião, ao Sérgio Teixeira e à Carla Valentim. A Semana Polar está on! Vamos aproveitá-la! Patrícia Azinhaga 23.02.2015
Escusado será dizer que as perspectivas da meteorologia para o dia de hoje geravam alguma ansiedade na comunidade de pessoas que em Barton tinham a sua partida programada para hoje. A verdade é que, mais do que a vontade de regresso a casa, que a maior parte de todos quantos aqui estão, naturalmente, acabam por sentir, é a incógnita sobre como se comportará o tempo permitindo, ou não, as operações necessárias: marítimas, para nos levar até à base chilena de Escudero de onde nos transportarão até ao aeródromo e aéreas, de modo ao avião proveniente de Punta Arenas, poder aterrar no aeródromo Teniente Marsh, na ilha King George. Na previsão meteorológica previa-se neve, baixa visibilidade e vento forte para a semana toda, excepto... umas doze horas durante o dia de segunda-feira ou seja, quando estava planeada a nossa partida de King Sejong. Confirmou-se, esta janela de bom tempo em que o sol surgiu a meio da manhã o que constituiu o terceiro dia de tempo soalheiro em vinte e um, sendo que o primeiro foi o dia da chegada. Nada mau, bom tempo à chegada e à partida, com um mar chão que percorremos nos Zodiac em direcção a Escudero. A despedirem-se de nós tínhamos a equipa de dezassete coreanos, entre cientistas e técnicos, que ficarão durante todo o inverno a manter o funcionamento da base. Em Fildes, antes de chegarmos ao aeródromo ainda conversámos rapidamente com a Carla Castelo e o Filipe Nogueira, a equipa da SICANTAR, em que tivemos oportunidade de fazer um breve balanço da contribuição do HISURF 3 para a campanha PROPOLAR 2015. Realizámos treze voos com o drone Suzanne Daveau, cobrindo áreas ainda não cartografadas com alta resolução, algumas delas onde os nossos colegas coreanos desenvolvem estudos sobre a vegetação podendo assim beneficiar de dados recentes de elevada qualidade. Efectuámos um reconhecimento de grande parte da península que permitirá um geomorfologia de pormenor e instalámos os instrumentos que pretendíamos e que, esperamos, continuem solitariamente a recolher dados e a resistir ao longo do duro inverno antárctico. Continuámos também com a aquisição de pontos de DGPS permitindo aumentar a rede de ground truthing do terreno. Olhando para as últimas três semanas parece-nos poder fazer um balanço muito positivo e esperar que próximas campanhas possam continuar neste sentido sempre coligindo mais dados de qualidade e colaborando com os programas científicos dos países presentes na região. Do ponto de vista humano a experiência também é enriquecedora ao permitir fazer ciência em contacto e colaboração com culturas tão diferentes como a coreana. Na última semana pudemos testemunhar a cerimónia de comemoração do Ano Novo Lunar data muito importante para a generalidade dos povos orientais. Punta Arenas é uma cidade ancorada na memória da passagem do navegador português por aquelas paragens e dos que continuaram mais para Sul na direcção da Antárctida. Do quarto de hotel olho pela janela sobre o Estreito de Magalhães adivinhando mais ao longe o continente que acabei de visitar pela primeira vez e já sinto a falta do voo das skuas por cima da minha cabeça. João Branco, Punta Arenas, Chile A base antártica chinesa na ilha do Rei Jorge destaca-se à distância na paisagem coberta de neve. O complexo tem vários edifícios de cores diferentes. Um deles só tem laboratórios. Mas por fora, o que dá mais nas vistas é um grande edifício azul com caracteres vermelhos e a respetiva tradução em inglês: estação da "Grande Muralha". Lá dentro, além da cozinha e sala de refeições, há um campo de jogos para badminton e basquetebol. O interior ainda está decorado para a comemoração do Ano Novo chinês que ocorreu a 19 de fevereiro.
Queremos ver a estufa onde os chineses estão a começar a cultivar hortícolas, como alfaces e pepinos, tão raros à mesa nas bases na Antártida onde se come sobretudo comida congelada ou enlatada. O engenheiro responsável explica que é um grande investimento, que o sistema usado é hidropónico e que a água recircula já com todos os nutrientes necessários ao crescimento das plantas. A estufa, ainda em fase de acabamentos, funcionará não apenas para produzir produtos para autoconsumo, mas também como laboratório em que irão testar as melhores técnicas de cultivo em condições controladas. Nesta altura do ano, a base chinesa já está com pouco movimento. Os investigadores partiram no dia anterior de regresso à China, depois de alguns meses de atividade científica nesta região. Noutras bases, contudo, há investigadores que ficam o ano inteiro. É o caso de uma investigadora sul coreana, a única mulher na base "King Sejong" (sem contar com a chefe) que está na península Barton para fazer um estudo sobre a saúde psicológica de quem aqui passa não apenas o verão mas também o rigoroso inverno austral. Nestas paragens o estado do tempo pode trazer frustração, mesmo para quem vem por poucos dias. A equipa de Beny Schmidt, médico e investigador da Escola Paulista de Medicina, sentiu esse desânimo. Não puderam ir a terra devido a condições meteorológicas adversas e ficaram retidos no navio da Marinha brasileira que os transportou da ilha do Rei Jorge até à ilha Pinguim. O patologista neuromuscular aborda-me frente ao avião da Força Aérea do Brasil que há-de levar-nos de regresso a Punta Arenas. "Sou filho do pai do teste do pezinho". Verdade? O seu pai foi muito importante! E você, que faz por cá? Beny conta que a intenção era recolher amostras de sangue e fazer biópsias musculares do pinguim-de-barbicha (Pygiscelis antarctica) para estudar o metabolismo destas aves, que suportam temperaturas dos -45°C aos 30°C, e encontrar uma terapia para a hipotermia e hipertermia malignas nas pessoas. O objetivo, diz Schmidt, é "salvar vidas humanas". No grupo está um português nascido no Brasil, que viveu um Portugal até 2010 quando, devido à crise portuguesa, resolveu ir viver para o Rio de Janeiro. Roberto Araújo ia sequenciar o DNA mitocondrial do pinguim, mas sem amostras de sangue nada feito. O pior é que já é a segunda vez que a equipa vem sem conseguir alcançar o objetivo. Agora esperam poder regressar no final do ano, quando for novamente verão, para mais uma tentativa. O avião descola e quase nem sinto. É difícil manter a conversa devido ao ruído. Coloco os tampões nos ouvidos. Os meus companheiros de voo ajeitam-se para dormir nos bancos de lona. Não tenho sono e fico a observá-los. Ponho-me a pensar como lidaria com a frustração, se o mau tempo nos tivesse impedido de realizar o nosso trabalho de reportagem? 27 de fevereiro Carla Castelo e Filipe Ferreira |
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