DIÁRIOS DE CAMPANHA
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GEOPERM III_#05: Rochas Piroclásticas – alguns aspectos destas rochas na Península de Fildes29/1/2017 Na impossibilidade de andar a seguir os limites das distintas unidades litológicas, não só por questões logísticas mas também, e principalmente, pela estrutura geológica existente na maior parte da região desta península, que é constituída por uma sucessão de escoadas lávicas intercaladas com rochas piroclásticas - fotos 1 e 2, onde são visíveis as referidas intercalações; as escoadas lávicas são mais compactas, com uma matriz mais homogénea, constituindo litologias que são mais resistentes à erosão, ficando em relevo relativamente aos materiais piroclásticos (foto 2); na foto 1, os níveis piroclásticos apresentam tonalidade avermelhada e uma escoada lávica espessa constitui o topo desta pequena elevação. As rochas piroclásticas são rochas volcaniclasticas (este termo é utilizado para descrever qualquer rocha clástica ou depósito gerado através de erupções vulcânicas, não levando em consideração os processos remobilização à superfície que eventualmente possam ter afectado estes materiais) formadas pela acumulação de piroclastos (fragmentos) durante as erupções explosivas (foto 3 ; foto 4). Ocorrem principalmente em magmas de composição intermédia a ácida (valores médios a altos de sílica), mas também podem ser produzidos a partir de magmas básicos, mais ricos em magnésio, normalmente ricos em voláteis (principalmente H2O e CO2). As rochas piroclásticas podem ser classificadas de acordo com a dimensão e abundância dos seus fragmentos- cinzas: <2mm; lapilli: entre 2 e 64mm; blocos e bombas: >64mm). Na foto 5 é possível observar uma espécie de brecha vulcânica constituída por fragmentos de distintas distintas formas e dimensões, mas sempre superiores a 64mm, dispersos numa matriz de lapilli e cinzas. A foto 6 é um detalhe da foto 4, ilustrando a diversidade de dimensões dos piroclastos e evidenciando as diferenças texturais entre os dois níveis piroclásticos. A foto 7 mostra uma pequena sucessão entre níveis mais ricos em blocos e bombas (mais resistentes à erosão), intercalados em bancadas mais espessas onde predominam os lapilli. Nesta pequena sucessão é possível determinar a inclinação das bancadas para NE. Nas fotos 8 e 9, os fragmentos mais grosseiros têm uma forma mais arredondada e encontram-se dispersos, e em relevo, no seio de uma matriz rica em lapilli – é um exemplo típico de um conglomerado vulcânico. Na foto 10 observa-se uma grande variedade nas dimensões e formas dos piroclastos, que por vezes atingem dimensões de 1 metro, constituindo um aglomerado vulcânico. Muitas destas rochas piroclásticas podem ser observadas no extremo Sul da baía onde se encontra a base científica Uruguaia, de nome Artigas (foto 11), junto ao extremo SE do glaciar Collins (foto 12). Nas paredes verticais do Glaciar Collins (foto 13), ou de qualquer outro glaciar, prevalece o Princípio da sobreposição dos estratos, usado no domínio da Estratigrafia, em que numa sucessão de estratos, cada estrato é mais antigo do que aquele que o cobre e mais recente do que aquele que lhe serve de base. Na base dos glaciares é frequentemente observado fragmentos de rochas que foram neles incorporados durante a geração / movimentação dos mesmos (foto 14). Despeço-me com amizade, e com um companheiro atento (Pinguim Gentoo) que também gosta de rochas!!! (foto 15).
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Último dia do ano do Macaco para dar início ao ano do Galo, que significa paz e felicidade. Para nós o grande galo é que ainda não temos o equipamento! Mas vamos esquecer isso por agora porque é um dia de festa. Este festival é o mais importante do ano na China, similar à nossa festa de passagem de ano. Entre estes dois dias, os chineses fazem todas as tarefas com muita calma e pouco trabalham, caso contrário há a superstição que o novo ano não vai correr bem. Logo, o nosso dia foi tranquilo e com pouco trabalho, mas o jantar foi especial, com muita variedade de comida e bebidas alcoólicas e, claro está, não podia faltar o karaoke. Um dos hábitos que têm é levantarem-se e irem brindar (gambe em chinês) mesa a mesa ou até mesmo um a um e é uma falta de educação não brindar. Uma das bebidas alcoólicas mais famosas tem 52% de álcool e é feita através de uma planta, que neste momento não sei qual é (também não posso pesquisar porque só temos acesso ao WhatsApp) e que tem semelhanças com o milho, mas, que segundo eles não tem semelhança nenhuma !!!??? Esta bebida tem um sabor e um odor bastante forte e é preciso ter muito cuidado porque senão não se fica em boas condições!!! Não me lembro bem!!!! Relativamente à comida, há de tudo mas o recorrente é o “dumpling”, uma iguaria típica da China, oriundo e muito popular na província Guangdong, segundo nos dizem. É um tipo de massa fina com a dimensão de um rissol e que pode ter vários recheios, nomeadamente carne. Nesta época festiva é muito característico comer-se em grandes quantidades. Durante o jantar estavam sempre a sair quentinhos e quanto mais saíam mais se comiam!! A tarefa de os comer com pauzinhos é que nem sempre é fácil, como se pode ver na imagem!! Outro momento alto é o karaoke! Quase todos cantam mas como tinha maioritariamente músicas em chinês, era difícil nós participarmos. Mas lá nos conseguiram arranjar algumas
músicas em inglês e pudemos cantar... bem, mais ou menos! Apesar da felicidade esta é uma época para estar com a família na China, um pouco como o Natal para nós, e havia nostalgia e saudades no ar!
O trabalho de campo pela Península de Fildes tem decorrido a um ritmo heterogéneo, muito pela culpa das condições meteorológicas que têm condicionado esta região. Já houve dias em que foi impossível sair, e outros em que passámos 10 horas em marcha contínua pela península. Uma semana se passou desde que aqui aterrámos. Nos primeiros dias, voltámos à zona da Meseta Norte, para confirmar alguns limites litológicos que tinham ficado por terminar, aproveitando a substancial diminuição da quantidade de neve que cobre este ano a superfície desta península (foto 1). Verdade seja dita, que essa diminuição da quantidade de neve é muito mais significativa fora da zona da Meseta Norte, mas mesmo assim existem áreas da meseta descobertas que há dois anos atrás estavam inacessíveis (foto 2). Em alguns locais no bordo da meseta, observaram-se “corredores” de alteração (com uma largura até dois metros (foto 3) corresponde ao local onde se encontra o martelo, em que os fragmentos de rocha apresentam uma estrutura planar muito mais penetrativa, comparativamente às rochas envolventes (primeiro plano da foto)), onde a circulação de fluídos terá sido mais intensa, alterando significativamente as lavas vesiculares aflorantes (foto 4). Na periferia da meseta, em que a alteração é mais significativa, os basaltos andesíticos que constituem as escoadas lávicas estão fortemente afectados pela crioclastia (foto 5). Já fora da meseta, na região Sul da península de Fildes, realizámos um trajecto de modo a cortar a estrutura vulcânica segundo uma direcção E-W, ao longo do Valle de Viento (foto 6) e que termina a Este junto à base Chinesa Great Wall (foto 7, Pedro Pina, Sandra Heleno e a base Chinesa ao fundo). Já junto à costa Oeste da meseta, as dúvidas acerca da inclinação das escoadas lávicas ao longo do Vale do Viento são esclarecidas com a observação da inclinação para NE (foto 8- inclinação visível no lado direito da foto, com a existência de um filão a cortar toda a estrutura lávica), favorecendo a hipótese das lavas mais antigas se encontrarem no extremo SW da Península de Fildes (zona entre a Punta Irene e Punta Eberhard, que se pretende amostrar nos próximos dias). As estruturas circulares intrusivas (necks vulcânicos) ressaltam bem na topografia da península (fotos 9 e 10; nesta última, visível um filão radial). Concluo com uma observação não geológica: a zona costeira à base Chilena Julio Escudero (Baía de Ardley) tem sido muito concorrida com icebergs e navios (foto 11). Nota do autor: Devido à constante divagação por historietas, que o autor destes posts (associados ao projecto GEOPERM III) tem vindo a relatar, e dado o atraso que já leva sobre a realidade actual, o autor decidiu viajar no tempo e descrever a actividade de campo que presentemente se encontra a realizar na Península de Fildes. Com o tempo, há a promessa de colmatação da lacuna temporal assim gerada.
Ja temos todos os peixes necessários para as experiencias que planeámos, mas continuamos limitados pela falta de material. Ontem o Sarmiento de Gamboa, um dos dois navios espanhois que apoiam o Propolar tentou descarregar o nosso material depois de não ter sido possível recebê-lo do outro navio, o Hesperides, na sexta passada. Infelizmente ventos de 25 nós impediram que os zodiacs pudessem ser colocados na água para trazerem a carga até à praia. Após 4 horas de espera o navio teve de zarpar para Punta Arenas de onde nos irão enviar os equipamentos por avião. Seguramente não chegarão até à próxima sexta e isto muda os nossos planos. Afinal a Carmen já não poderá sair a 3 como planeado e tentaremos terminar tudo até 11, quando o Hespérides volta para nos levar até Yelcho, para a segunda fase da camapanha! O problema de momento é alimentar os animais até que possamos receber tudo e inicar. Vamos procurar anfípodes e outras opções junto com os colegas chilenos que estão a fazer experiencias em Escudero com Harpagifer antarcticus e que hoje procuram peixes durante a maré baixa entre pedras no meio de grandes blocos de gelo. Não estamos sós – os pinguins divertem-se e divertem-nos com os seus saltos. Saímos pelas 9h00, logo após o briefing matinal com o chefe de base. Dirigimo-nos, eu, o Pedro Pina e o Pedro Ferreira, para a Meseta Norte, um planalto no interior da Península que é também a sua região mais elevada. Na subida para a Meseta fomos reencontrando as nossas companheiras skuas, que já parecem estar a habituar-se à nossa presença, e se mostram menos defensivas e mais curiosas. O tempo apresentava-se perfeito: pouco vento, muito boa visibilidade. Mas também muito frio, sobretudo no topo da Meseta. De tal forma que, depois de dois primeiros voos bem-sucedidos, as baterias do drone arrefeceram demasiado, e este começou a apresentar comportamentos erráticos, com dificuldades de ligação ao controlador. Optámos por isso por guardar todas as baterias em bolsos interiores dos casacos, e fazermo-nos de novo ao caminho, para as aquecer. Descemos a vertente norte da Meseta, na direcção da costa, e encontrámos um enorme campo de círculos de pedra, com mais de 1Km de extensão. Estes círculos formam-se espontaneamente em solos susceptíveis a ciclos de variações térmicas, através de um mecanismo de circulação convectiva da camada superficial do terreno. No interior dos círculos o material mais fino surge à superfície, afastando para a periferia os solos de textura mais grosseira. No local que visitámos, o interior dos círculos apresentava muitas vezes contraste de cor em relação à periferia, dando ainda mais beleza a estes campos. Por esta altura as baterias do drone já tinham aquecido com a caminhada, e pudemos realizar vários voos nesta região. O regresso à base tinha de ser em passo rápido, pois fazia-se tarde! Caminhámos um pouco ao longo da costa, espreitando bonitas praias povoadas por lobos e elefantes marinhos, mas inflectimos rapidamente para o interior, contornado a Meseta pelos seus lados Norte e Oeste, até chegarmos à base, já em cima da hora do jantar. Estávamos os três estafados, depois de um dia inteiro a caminhar (12 km no total) mas muito contentes com o trabalho feito. A seguir ao jantar, como de costume, eu e o Pedro Pina ainda processámos e analisámos algumas das imagens adquiridas durante o dia. Para mim, que estou na Antártica pela primeira vez, este foi o dia em que comecei a sentir-me verdadeiramente à vontade com as condições do terreno. Gosto de caminhar no frio, a neve e o gelo já não me causam insegurança no pisar, e a alma alimenta-se de tanta vastidão e beleza. Parece-me que apanhei o “bichinho da Antártida”…
E ao terceiro dia não deu mesmo para voar. O tempo logo de manhã não estava famoso, verdadeiro contra-senso, pois duvido que haja alguém mais badalado na Antártida do que o tempo. Decidimos na mesma sair da base até à Meseta Norte, pois as previsões indicavam uma melhoria para o fim da manhã. Lá fomos, por lá andámos, à espera da tal melhoria, mas nada, a dita cuja não apareceu mesmo. Depois de bem pingados, decidimos voltar à base a tempo ainda de almoçar. Foi uma higiénica voltinha de mais de 5 km. E bem o fizemos porque à tarde choveu mais, nevou também, soprou uma ventania dos diabos e a neblina caiu até cá abaixo. Foi uma oportunidade para ficarmos na base e começarmos a processar as imagens captadas nos voos dos dias anteriores. É fundamental avaliar já a qualidade da informação captada para, caso seja necessário, fazer correcções. Em suma, é preciso montar as várias imagens individuais num mosaico de maiores dimensões usando métodos de processamento de imagem adequados, testando e escolhendo os parâmetros mais apropriados. Por fim, obtém-se um modelo digital de elevação que permite ortorrectificar o mosaico das imagens. É um processo relativamente moroso, nem sempre fornecendo bons resultados nas primeiras iterações. Por exemplo, é por vezes complicado ‘colar’ as regiões com neve (todas iguais ou muito parecidas), sendo no entanto um processo que se torna bem mais simples quando as pegadas que lá deixamos aparecem nas imagens. Em boa hora apanhados! Mas é sempre com expectativa que esperamos pelo resultado final que, quando atinge a desejada qualidade, nos deixa sempre encantados. Poder ver de cima uma superfície de terreno, que naturalmente nos é inacessível, continua ainda a ser para mim um espanto. Por outro lado, a quantidade de baterias que é sempre necessário pôr a carregar após a vinda da rua não deixa de ser impressionante. E mostra bem a nossa actual dependência da tecnologia. Contei, entre as várias baterias do drone e respectivos comandos, máquinas fotográficas, gps, walkie-talkies ou power-banks, mais de uma dúzia!
O dia 19 Janeiro foi o dia D e representou a entrada da equipa do Projecto Hg-Planktarctic na Península Antártica, juntamente com mais 4 equipas participantes do Programa Polar Português 2016/2017. Apesar de em Punta Arenas o céu estar nublado, o estado do foi melhorando gradualmente ao longo da viagem que durou aproximadamente 2h, e aquando da aterragem na ilha de King George, o tempo apresentava-se como um verdadeiro dia de verão (6 °C), sem vento e com bastante sol, o que resultou nos primeiros escaldões dos participantes lusos. Na ilha pudemos observar os primeiros pinguins que fizeram as nossas delícias e foram objeto de muitas fotos divertidas. Enquanto esperávamos pelo transporte do navio Espanhol, Sarmiento Gamboa, que nos ia levar ao destino final, Deception Island, pudemos visitar a base militar Chilena, a base Escudero, assim como a capela ortodoxa Russa, muito digna de uma visita. O transbordo foi feito com auxílio de Zodiac e teve a duração de aproximadamente 1h, devido à presença de blocos de gelo, o que implicou o uso de um fato seco de um tamanho muito acima do nosso e que nos deu um aspeto muito engraçado. O mar estava sem qualquer ondulação pelo que se tratou de um passeio com direito a observar as brincadeiras dos pinguins que individualmente ou em grupo circundaram o barco. Pudemos observar também uma foca leopardo que descansava calmamente num bloco de gelo. Pelo que a chegada ao Sarmiento Gamboa aonde pernoitamos foi muito agradável e queremos agradecer a simpatia de toda a tripulação que nos acolheu. Pelas 5h da manhã, passamos para um outro navio espanhol, o Hespérides, onde fomos igualmente bem recebidas e passamos uma noite. Este último levou-nos finalmente à ilha Deception, onde fomos admitidas com muito entusiasmo, o que claro nos aqueceu a alma. Agora é montar o nosso laboratório, que veio em 5 caixas de metal e dar início ao nosso primeiro trabalho Antártico.
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